17.3.13


Manhã de quedas.
Quedaram das árvores as folhas, em nota musical contínua e menor.
Quedaram dançando, sempre em direção ao chão.
Depois o vento frio e a garoa, assim. Diagonal da tristeza.
O outono é uma tristeza que não é triste.
O vento venta saudade e perfume de quem não tá mais.
Perfume que não tem mais cabimento físico nesse espaço, o vento trás.
Lembrança esquecida em fundo de armário e gaveta, caixinhas escondidas, fotografias de folhas de algum lugar.
O vento insiste.
Trago do ar um vento meu e só pra mim, eu só como sou e sempre.
Também eu vou me caindo e desprendendo.
Só então entendo as árvores.:
:
Dói um bocado.
Cada folha que decide quedar.
Também dói recolher o que ficou
(as fitinhas coloridas no lugar das fotos cheias de folhas verdes, de um tempo chamado (sussurra) primavera)
É o começo. Outono. Estação da minha nascença, retorno eterno, solidão de entranha.
É bom quedar-se. As palavras grandes e definitivas assustam, e é bonita a chuva contra a luz. Eu caio com ela.
Existe alguma chance de eu existir nesse lugar e não ser também a árvore que abandona as folhas?

27.1.13

não que morna, envolta, deixasse de ser dolorido. colorido, era. pressentia a luz, que pra além da dura dor de até ali, haveria uma dor ainda maior, uma dor queda no precipício inesperado, precipício-fossa-túnel sem atalhos impossíveis.
não que ali. quieta, agitada. respirando, agora com alguma paz. soubesse essa paz um fim. pressentia a força de um vácuo, buraco-túnel-fosso que cairia ela para cima.

ela que era feita menos de pensamentos e mais de peles sensíveis sobrepostas.

sua gestação seguindo pelo faro o rastro da luz.

o rastro que ela sentia, pressentia, percebia puxando no seu antes, era o fosso-túnel-buraco pra cima, que ela agora sabia.
ser-lhe-ia dada a luz.

a dor da vida, insuperável.

22.11.12


Talvez ela estivesse acumulando desorganizações para manter a mente ocupada e distraída da desorganização maior: ela própria.

MAS VOCÊ NÃO SE CANSA DE TANTA LITERATURA ESTÚPIDA E DESABAFO SOBRE SI MESMA? NÃO SE CANSA DE TANTO EXISTENCIALISMO BARATO?

Cala a boca, sua voz não é a minha, sua voz não sou eu. Não me sinto cansada.

Comprou um presente para si mesma há uma semana: ainda não abriu.

Se vai esperar o natal?

Duas garrafas de vinho vazias ao lado da cama. Uma nem tanto. Agora sim.
Pedaços de outros tempos passados, planos futuros, no futuro ainda de serem escritos no bloco de notas, nem isso, os planos voam desapercebidos e esquecidos no dia seguinte pela manhã – já há quanto tempo sempre atrasada?

TEMPO?

Talvez que os planos futuros houvessem mergulhado nas garrafas em busca de algum restinho.

Amanhã ela vai jogar fora essas garrafas.

21.11.12

E depois de tantos desencontros, fosse talvez agora o momento em que ela, caindo num inevitável buraco negro, branco, procurando na memória qualquer lembrança boa que pudesse trazer algo.

Não que ele significasse algo pra ela.
Não que nesse tempo todo ele tivesse significado.
Uma coisa boa que passou e perdeu o sentido por alguns motivos.
Uma coisa boa.

Mas ela tinha ouvido falar dele, e assim não se sabe porque - obra do acaso - resolveu fazer uma coisa, um atrevimento.

Mandar por e-mail a música que eles tinham ouvido tantas vezes: na sala da casa, no chão, e perguntar se ele lembrava.

Love me two times, baby. 
Love me twice today.

Decidiu, finalmente.
Mas a internet falhou.

Repensou, redecidiu.

Foi enviar a música, atrevida e feliz.

Mas a foto do perfil dele era de beijo na boca apaixonada da outra, apaixonados...
Era de beijo na boca.

Era assim o tempo, cheio de surpresas. A música ficou para sempre suspensa entre o CTRL C e o CTRL V.

Nada importante.
Deu quase uma saudade.

I´m goin' away.

26.10.12

e que o amor era de novo triste, a descoberta do inferno receptivo da euforia velada, velada por? velada pelas madrugadas cheias de um vazio intenso, as vezes preenchido, mas sempre uma sensação de vazio, e. quando me cobrias, cheia de volúpias, eu no fundo de mim às vezes pensava por um mim que não pensava, ser o avesso do asco, um asco assim, não sei, uma asco desejo de encobrir-se. deixa-me ser coberta? deixa-me ser cobertor? eu posso, eu sei, esconder-me. nenhuma cabana, nunca foi, nunca será, nenhuma cabana, esconderijo suficiente. e quem dirá que esse amor é menos? é menor? não era essa a intenção? viver menos, viver menos até sumir? por que então esse desejo intenso de subir e ser mais, e ser mais? que queres de mim? eu te pergunto calada e calada prossigo, que na cabana escura das horas sem fim é meu silêncio que propaga a garganta escondida. escondida que está, de mim. mas quando menos espero te acho, e não serás, e nunca serás, coberta por mim.