10.1.07

-Se bem que também ela é uma criança... Revidou o homem quieto e que em nada parecia prestar atenção.
-Não é mais criança não, eu nessa idade já trabalhava e se faz isso é porque quer!
-Ela grita como se arrancasse as roupas não por necessidade mas por cansaço.
-Não ouço gritos,velho caduco.
-Mas eu ouço e são estridentes!
-Mas a menina é mesmo uma vagabunda, meu senhor. Penso até que o senhor tem algum interesse!
-Pois se é só isso que as pessoas tem por aqui, não é mesmo, minha senhora?

O olhar dela é sensual, disse a moça cheia de brincos falando no celular. Não, ela não falava da moça que andava como que em câmera lenta em direção à fonte. A maldita que seguia despida de qualquer pudor mentiroso e não havia choro real nem riso nem gosto doce ou amargo, mas no mesmo instante todos se viraram para a moça e viram sensualidade bruta em seus olhos... Possuía nos olhos qualquer coisa que eles quisessem ver.
A praça virou um tribunal:
:
A moça na forca pronta pra ir a julgamento

Magra e cansada apesar da idade
Será que já tinha 16?
Vê que seu jeito de andar deixou pelo caminho algumas ou muitas vidas, outras tantas mortes.
Ninguém mais se preocupava, pois cabia bem condenar um anjo às seis da tarde na metrópole do fracasso. Se eles não chegassem ela provavelmente que ficaria ali por ainda muito tempo não tinha jeito de ir embora não tinha pra onde ir já que o embora era ali naquele momento.
Momento
Jamais que ela pensara em momento.
-Vê seus ombros caídos? A moça tomou as decisões certas durante a vida.
-Certas? Não vê que é uma puta coitada que não tem pra onde ir?
-Pois com as outras decisões a seu dispor ela não seria nem puta, nem coitada, nem gente, minha senhora! está viva! isso basta!
Então ela olhou com desprezo pro homem que dissera tais palavras.
Além de sensualidade seu olhar agora tinha desprezo!
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Por pressuposto que assim, seus olhos eram os olhos algozes de todos os presentes.
Sendo tudo que então, para ela se colocava, a menina-moça-mulher terminava por ser prisma do tudo: nada.
Essa vagabunda não é nada!
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Seguia cansada da vida serena da vida pacata da vida cheia de martinis e noites quentes e diferentes cansada da vida repentina e graciosa cansada de sua própria beleza escrava e de seu próprio cansaço. Qualquer um que lhe tomasse pelo braço a levaria, era o que qualquer um dizia, que chegassem oferecendo o céu ou o inferno, ou que dessem prazos e tempos e flores e cárceres.
Via eu nela a independência nascida do cansaço porque é do cansaço que vêm o nascimento, é no cansaço que se muda e se cria outra forma. Agora tomaria uma porrada quem se atrevesse a tocar-lhe o braço. Ouviu-se uma música grande, uma música que vinha do fundo de algum lugar. A moça sentou-se ao lado da fonte e de repente todos voltaram às suas tarefas... As coisas tomaram o ritmo anterior. Velhos sentados nos bancos, cercados de forcas e de buzinas. Velhos fracos. Um velho doente babando recostado em uma estátua de mulher nua. Tudo tinha o mesmo ritmo. Cada velho trancafiado em seu próprio universo, cada pessoa obedecendo ao paladar proposto, ouvindo no silêncio as regras do jogo: Passar pelo corredor devagar, sem fazer muito barulho, carregar sua cruz de olhos abertos, ainda que lacrimejantes, e quando finalmente chegasse ao portão, fechar os olhos e seguir o caminho que leva a eternidade proposta.

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